Depois de 3 noites tirando fotos, observando, anotando e escrevendo loucamente no meu diário de campo sobre o que vi no PFW, resolvi repensar o que havia dito anteriormente sobre me manifestar no blog ou não, e expor um pouco o que essa edição despertou em mim: percepções e sentimentos que foram um pouco além das edições anteriores. Fiz contatos e conversei um com várias pessoas, na grande maioria aquelas com quem eu já possuía um mínimo de intimidade e liberdade para conversar da forma mais pessoal possível. Mais que qualquer outra coisa, era isso que eu queria, compreender um pouco do significado que estar ali e fazer parte daquilo tinha para elas. Opiniões das mais diversas surgiram, e me fizeram pensar um bocado sobre todo esse contexto. Não quero falar sobre o evento em si, porque bem sei que vários outros meios de comunicação já fizeram isso, com riqueza de detalhes e imagens, inclusive. Tomo a liberdade para quase fazer um ctrl+c/ctrl+v de uma pequena parte dos meus escritos, daquilo que mais chamou minha atenção. Àqueles que concordarem ou não, peço liberdade para me expressar. Afinal, blog também é Diário:
Escutei críticas de várias pessoas. Boa parte delas sobre o evento e os presentes, dizendo que falta muito para que o PFW assuma os moldes de uma semana de moda. Disso eu não posso discordar, afinal em alguns momentos o mesmo me parecia bem mais uma feira de moda que um evento de criadores, já que os desfiles eram de marcas locais “prêt-a-porter” ou de lojas que trazem roupas de fora. Nisso eu acho o que é apresentado incoerente com a proposta do evento (ou que deveria ser, enfim), que é apresentar criações/idéias de estilistas locais. Talvez essa incoerência (além de outros elementos, como a data desfavorável dentro do circuito da moda) tenha feito com que haja um número inferior na presença de criadores e estilistas nos moldes “clássicos” da coisa, por assim dizer (que não se sentem impelidos a se apresentarem na proposta do evento), e um aumento no número de marcas mais populares (já que até aqueles estilistas que estão presentes o fazem, predominantemente, para apresentar o que produzem em parceria com essas marcas).
Ao mesmo tempo eu me questiono: Não será essa a necessidade local, e que devido isso, o evento tem tomado esses rumos? A princípio eu até pensei que o mesmo pode perder força com o passar dos anos (ficava me perguntando isso enquanto conversava com as pessoas), desta forma, mas talvez não. Tudo são possibilidades. O fato é que nosso estado não possui décadas de história de moda, mas já tem alguns bons anos de indústria têxtil e produção de vestuário, o que pode fazer com que eventos do tipo, pelo menos por enquanto, tendam a seguir o caminho da produção comercial, e não da apresentação de conceitos e tendências.
Percebi o que parece ser um caminho mais simples em apenas criticar, sem maiores reflexões, um evento desses quando se tem como referência informação de moda adquirida em sites do eixo Rio – São Paulo, e acompanha pelos veículos de comunicação as semanas de moda européias, cujo histórico já conta com várias décadas e muitas vivências absolutamente diferentes das nossas. Sim, a referência de moda que a grande maioria de nós temos (e nisso eu me incluo) é criada a partir dessa forma “burguesa” de conhecer, perceber e compreender o mundo. “Ah, Augusto, mas não há empenho por parte de quem organiza, parece evento de preguiçoso”. Sim, eu concordo. Senti falta de firmeza, de ousadia, da escolha de um espaço mais favorável, de um monte de outras coisas. Falta muito, muito pra ser um evento merecedor de reconhecimento nacional (tomemos como exemplo o Ceará, que aqui do nosso lado tem o já reconhecido DFW). A história da moda piauiense talvez esteja sendo construída agora (e por isso mesmo merece esforço por parte dos envolvidos), mas é difícil compreendermos isso se tivermos acesso constante ao que é considerado o melhor, e partirmos somente disso. Em situações do tipo, relativizar é preciso.
Refletindo agora, penso que talvez o evento não corra riscos, e que até esteja indo bem das pernas. Afinal, o mínimo necessário estava lá: desfiles, roupas, divulgação de lojas (vendas e circulação de dinheiro, posso apostar), e, principalmente, pessoas. Várias, adequadas ou não. E creio que elas fazem o evento acontecer de verdade. Mais que qualquer outra coisa, me chama atenção o fato de que ali é um espaço de socialização: todas vão para verem e serem vistas, e é em nelas (ou pelo menos em parte considerável) que a moda e as tendências estão de fato presente: animal print, saias mullet, cores fortes, dourado, brilhos… Acontecendo e circulando, adequadamente ou não. Ou até mesmo a opção de apenas usar uma roupa simples. Tudo são escolhas. Há uma troca de informações visuais que engloba uma rede que muito provavelmente compreende desde o F*Hits, o WGSN, a Vogue, e etc, até uma ligação telefônica com um “com que roupa tu vai?” Há um mundo físico e simbólico entre estes espaços, que é um mundo real, que está acontecendo.
Inadequadas ou não ao contexto, talvez falte às pessoas habitus, pensando um pouco de forma Bourdieusiana. Talvez falte-lhes a apropriação necessária do que vem do topo e do que faz parte de sua realidade, de incorporar aquilo que está acontecendo no seu mundo de maneira ativa e crítica, para que se socializem por meio e a partir disso. E isso só poderá ser possível com vivências, experiências… Então não nos precipitemos com opiniões descuidadas. Ah, e, por favor, compreendam: Não estou aqui pra defender o evento, mas sou a favor de que o mesmo aconteça. Como bons interessados em moda que somos, temos que “apreciá-la” também no nosso espaço: errando, tentando, arriscando, acertando, até pegar o manejo da coisa; para que um dia (em breve, espero) possamos dizer que acompanhamos o começo e manifestar um pouco mais de orgulho sobre a moda do Piauí.